Leitor

Lamentámos tudo o que há para lamentar. Dêem-me a escolher e escolherei sempre o percurso que mais me sorri. Hoje, ao olhar para trás, o que mais me comove não é a saudade. Nem tão pouco a melancolia. É a impotência contra o tempo, destino, passado incontrolável tal e qual como o presente, quiçá o futuro. Vejamos bem as coisas, quem de nós dois quis fugir de nós? Fizémos nós, perdemos os laços, lá se foram os abraços, só para mais tarde recordar. Num tempo tão perdido em que risos faziam parte de uma doutrina só nossa mas tão vulgar para ser de toda a gente. Afirmamos ser tão diferentes e somos todos tão iguais. Nós, que promessas dizemos ter feito sem as cumprir, e muitos de nós também não sentimos a consciência pesada por as termos deixado para trás com tudo o que já vivemos. Relativizando tudo o que foi dito e vivido, porque afinal crescemos e "só faz falta quem cá está". Quanta hipocrisia criticamos sem saber que contra nós falamos. Arranjamos sempre as mesmas desculpas, irrisórias porém, de que o tempo não chega para tudo, de que afinal, as pessoas acabam por seguir caminhos diferentes e que tudo acontece por uma razão.

Que se foda quem pensa assim. E que me foda eu.

Que de tantas e tantas vezes pensei que iria ser diferente, afinal, bastava um contacto e tudo voltava a ser o que era. De todas as vezes que nos reencontramos, as promessas voltam a pairar sobre nós como uma flecha sem alvo, porque dias depois, já não nos lembramos das saudades que sentimos de tudo o que vivemos. E entretanto há algo que nos faz lembrar. Um nome no vazio, uma experiência relatada, uma gargalhada semelhante ou apenas um deja vu. E voltamos a sentir falta. E nada fazemos para alterar isso. Seguimos todos com as nossas vidas medíocres, com as novas pessoas com quem passamos mais tempo, com a maltinha do dia-a-dia. Hipoteticamente felizes se não fôsse apenas isso, hipoteticamente. 

E na hora do aperto, na hora da aflição, perguntarmo-nos onde andará a pessoa que nos iria ajudar, apoiar e relembrar que tudo iria ficar bem. Provavelmente seguiu também o seu caminho, provavelmente também se lembrou de todos os momentos e de todas as promessas. Provavelmente também já precisou de ajuda mas não conseguiu pedir. Pois. Porque afinal não basta um contacto para que tudo fique bem. Porque podemos gostar mundos e fundos daquela pessoa, mas perdemos a confiança depositada. Porque os juros são bem mais caros do que o orgulho perdido momentaneamente. É alto o preço a pagar pela perda de um amigo. E mais alto ainda se torna quando, por aventuras do destino e da vida, o reencontramos e sinceramente, já não o conhecemos. É isso que dá mais desgosto. Porque a vida é feita de encontros e desencontros, mas cabe-nos a nós decidir quando queremos ficar de vez. 

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