Leitor

open;eyes

A distância só mata o amor que já está doente na hora da partida.

 Ainda aqui estavas e já eu tinha saudades tuas. Continuo a ridicularizar todas as palavras evocadas em silêncio, pensei que nunca as quisesses ouvir. Somos feitos de carne e osso e arrependimentos, e, à parte da matéria que me constitui, vou-me afogando em desejos infindáveis de ter feito o que devia no momento oportuno. Digo eu, na tentativa de me iludir mais um bocadinho, que oportunidades não me faltaram, mas eu sabia ou julgava saber que a hora certa iria chegar e eu iria reconhecê-la como um cego que reconhece o toque de quem ama, de quem espera, de quem anseia. Estupidez é saber que algo é esperado. Eu não esperava descobrir que, quando a minha derradeira oportunidade chegasse, tu terias outra chance de fazer algo diferente. E ainda continuo sem saber como foi que me perdi no tempo. Quem diz que nunca é tarde demais não sabe o que é ver a areia fugir por entre os dedos. Tentar parar o tempo. Soprar o vento para que ele vá na direcção contrária. Apagar o sol só com um fechar de olhos. Fazer com que ficasses, só por agora. Ainda aqui estavas e eu já tinha saudades tuas. Acabava por sentir um consolo ínfimo por saber que, apesar de nunca o termos dito, estaríamos sempre perto um do outro, e na minha equação, eu não saberia o que dizer quando me fosses subtraído. Só Deus sabe (e porque não tu? que eu nunca fui de religiões e Ele nunca me atendeu na hora certa) o poder que tiveste de me calar quando tiraste o mundo dos meus pés. Um único ser nos falta, e fica tudo deserto. Porque eu sei que pisei o risco. Que estava ali à beirinha, a brincar com as pedras e a olhar para o precipício. Eu estiquei a corda e ela partiu. E com ela partiste tu, mesmo quando eu achava que seria hora de dar uma volta de 180º e voltar a pisar terra firme. Cometemos sequencialmente o erro de perder oportunidades por orgulho, mania ou desculpas e quando finalmente achamos que já chega, que está na altura de pausar a vida e arranjar um novo rumo, vemos que fomos só nós que pausámos. Que os outros continuaram os seus rumos. Cada um arranjou uma solução diferente para o problema que teimámos em guardar com amor e carinho só porque sim: porque é mais fácil manter o problema por perto e continuarmos a vigiá-lo com medo que ele volte a fazer uma das suas do que resolver virar-lhe as costas e engolir as consequências. E quando achamos que poderíamos finalmente resolver as coisas é quando nos é imposta uma nova situação; um novo teste. E pouco mais nos resta senão aceitar que cada um sabe ou finge saber o que quer, que não podemos ser egoístas e esperar que as pessoas nos esperem eternamente. Somos obrigados a aceitar. E custa tanto aceitar... Ainda aqui estavas e eu já tinha saudades tuas. Alguém muito sábio uma vez me disse: arrepende-te apenas daquilo que tu não fazes. Mas eu arrependo-me daquilo que fiz e choro por aquilo que não consegui fazer. É tarde demais. É não saber o que fazer com os dias que ficaram mais compridos, não saber como encontrar tarefas que me cessem o pensamento, não saber como calar as lágrimas diante de uma música, não saber como vencer a dor de um silêncio que nada preenche. Porque as saudades não se cingem apenas à falta física ou à lacuna deixada em memória por alguém.Termos saudades do que não existiu principalmente por nossa culpa dói bastante.O amor calcula as horas por meses, e os dias por anos; e cada pequena ausência é uma eternidade. Para quem ama, não será a ausência a mais certa, a mais eficaz, a mais intensa, a mais indestrutível, a mais fiel das presenças? No fundo, o truque é fazer com que a nossa ausência seja notada o bastante para que alguém sinta a nossa falta, mas não a podemos prolongar demais para que esse alguém não aprenda a viver sem nós. 

Só resta aceitar e aprender. A não deixar fugir. A não deixar escapar. A viver as coisas quando achamos que têm que ser vividas e a não esperar pelo momento certo. Porque acabamos por descobrir que o momento certo já passou e nós nem reparámos. Quem tem um amigo, mesmo que um só, não importa onde se encontre, jamais sofrerá de solidão; poderá morrer de saudades, mas não estará só.
 De tudo o que poderias ter sido para mim, ambos escolhemos que deverias ser a falta. O vácuo. O arrependimento. A saudade. Eu precisava ser, e só consegui ter. Se me esqueceres, por favor, esquece-me bem devagarinho.

É que ainda agora aqui estavas. E eu só sei ter saudades tuas.

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